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Cracolândia: até quando?

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cracolândia

por Ricardo Castilho (*)

Há mais de 30 anos vejo pessoas vagando pelo centro de São Paulo, evidentemente drogadas, no movimento que se convencionou chamar Cracolândia – eufemismo para identificar usuários de crack e afins e que até hoje é uma pedra no sapato dos responsáveis pelas políticas públicas de São Paulo.

No efeito sanfona para resolver o problema, os usuários são escorraçados, em vez de apoiados. Enquanto isso, continuam presa fácil e inerme dos emissários do caos, prontos para “reavivá-los” com as mais modernas ofertas de ilusão, como a devastadora droga K.

Tantos governos, tantos discursos… Não seria a hora de as autoridades reconhecerem a sua trintenária incompetência e pedir ajuda? De se desvestirem da arrogância e da prepotência do cargo e calçarem as sandálias da humildade?

A sociedade civil pode ter soluções. Tem sido ouvida? Não custa insistir: é preciso juntar em uma mesma mesa todas as pessoas e instituições interessadas na solução do problema, inclusive e principalmente, representantes dos “indesejáveis”.

Se há padres e pastores que efetivamente querem ajudar, por que não aglutiná-los como um braço prático permanente e não apenas de atuação episódica, como no Natal?

Como operador do Direito, sei que a Cracolândia é uma das faces visíveis do complexo fenômeno da violência. Problema de saúde pública, sim. Mas também de criminalidade, porque além dos traficantes há rufiões infiltrados entre os andrajosos e tristes moradores daqueles monturos.

É, em última instância, um enigma para a sociedade mas, principalmente, para o Poder Público, a quem cabe a obrigação e a responsabilidade constitucional de resolvê-lo.

A verdade é que perdemos a mão e não estamos conseguindo compreender o que é necessário fazer para salvar as pessoas que se drogam, suas famílias, os transeuntes que passam por eles, os comerciantes e escolares que temem a violência que, a cada investida da administração pública, aumenta.

E a violência é o mais grave problema que a humanidade está enfrentando nesses primeiros anos deste terceiro milênio. Aquelas pessoas e nós, cidadãos, precisamos de ajuda, senhores governantes. Vocês precisam de ajuda, senhores governantes!

Bertrand Russell, crítico social e pacifista, disse que “o princípio supremo, tanto na política quanto na vida privada, deveria ser o de promover tudo o que for criativo e, assim, diminuir os impulsos e desejos que giram em torno da posse.”

Não disse nada de novo, mas busco essa referência para refletir. A ganância de ter, seja posse material ou posse de prestígio junto à mídia, embaça o olhar de quem observa, ungido pelos cargos, esse problema que sempre vão deixando para depois, quando passa o momento da cobrança e os espectadores esquecem temporariamente do assunto, até que o governante de plantão anuncie a mesma solução mágica de sempre: mudar o sofá da sala.

Até quando?


 

(*) Ricardo Castilho —  jurista e escritor, pós-doutor pela Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). É diretor acadêmico da Escola Paulista de Direito.

 


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